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Me desculpa, Messi

por Gabriel Cruz Lima
Foto de Luísa Machado para "Me desculpa, Messi", texto de Gabriel Cruz Lima

Gabriel Cruz Lima é jornalista pela Faculdade Cásper Líbero e graduando em Letras pela Universidade de São Paulo. É autor de “O Último Romântico” (BAR Editora, 2020). Assim como o São Paulo Futebol Clube, está de volta no coração dos emocionados e a um passo de um título relevante.


Chegou domingo, final de Copa do Mundo e a ideia é meio triste, porque frustrante. Eu sonhei, imaginei, tive a ousadia de querer o Brasil ali perfilado ouvindo o hino. Entretanto, Argentina e França duelam pelo tricampeonato mundial hoje. Se estou triste porque o esporte mais uma vez ensina que sua regra principal é aceitar a derrota, estou muito mais triste, por antecipação, pelo Messi.

Sou pé-frio. Eu já tentei me convencer de que eu não entro em campo e que de muito pouco, ou quase nada, adianta minha torcida. Mas a verdade é que sou toda hora injustiçado: são-paulino e de esquerda. Golpes duros sofridos, pouquíssimos ganhos, vários retrocessos no campo na última década, tanto progressista quanto futebolístico. E, de alguma maneira, mesmo que eu saiba que meu raio de ação é mínimo, eu acho que isso tem a ver comigo.

Todo pé-frio tem um pouco de paranoico. Quem está do lado dos vencidos, tem a impressão – a certeza – que, se colocássemos a camisa do avesso, a meia trocada, feito uma figa a mais, ou sentado naquele lugar, a cabeceira da mesa onde o avô ficava aos domingos fumando delicadamente para acompanhar futebol e o noticiário, seria diferente. Daí a paranoia, em que o resultado depende muito mais de um ritual individual que de um processo coletivo.

Sob a perspectiva analítica, não tem sentido eu ter visto a Copa do Mundo com o uniforme azul da seleção brasileira enquanto meus amigos estavam com a camisa amarela. Porém, esse ritual tem seu motivo (paranoico), a ideia de Yin Yang, de um taoísmo difuso, o encantamento dos polos opostos, o equilíbrio nas jogadas; nem tão ataque, nem tão defesa, caminhos inescapáveis para a vitória. Talvez alguém na Croácia tenha feito o mesmo. Espero que não seja o caso da França hoje.


Sim, eu já separei minha jaqueta da Argentina para usar nesse calor de 30 graus e preciso dizer o quanto vou torcer para ver o Messi ganhar. Porque é ele, e não outro, o meu ídolo do esporte. E talvez essa seja a última oportunidade de vê-lo incorporar a albiceleste.  É ele, e não outro, que me fez levantar da cadeira quando, na final da Copa do Rei, driblou metade de um time e fez o gol mais emblemático que eu já vi ao vivo. É ele, e não outro, o melhor jogador do meu esporte favorito. Infelizmente, minha torcida, a torcida de um pé frio assumido, significa a derrota. Assim, já digo antecipadamente me desculpa, Messi. 


Mas se tem alguém que joga contra as probabilidades, é o Messi. Apesar do tamanho franzino em um esporte que prima cada vez mais pelo atleticismo, ele é capaz de superar seus adversários. Por que não seria também capaz de superar meu azar? Se não for, novamente, desculpa, Messi. Só ao Messi.

Não vou pedir desculpas ao povo argentino, porque minha paranoia não é tão grande assim. Apesar de ter a noção de que a rivalidade com os hermanos é implantada da época das ditaduras latinoamericanas e da sensação de irmandade entre o sul global, existe dentro de mim uma voz ufanista, genuína, que me diz uma verdade que não posso ignorar: “Ganhar é bom, mas ganhar da Argentina é muito melhor”. Mas, se for para ver o Messi ganhar, tudo bem, hoje, eu abro essa exceção. Se for possível para um pé-frio.


Quando o Clarín Diário ou o Olé publicarem meu nome, vocês vão entender que tem um sentido de cuidado que as pessoas não entendem no pé-frio. É sempre ele o culpado pela derrota, como se a sua presença alterasse drasticamente as linhas invisíveis do árbitro de vídeo. É a gente que vai assumir a bronca quando estivermos vendo os gols da França no Fantástico. Somos nós os culpados das bolas de Neymar e Paquetá contra a Croácia não terem entrado, porque estávamos na frente da televisão, desalinhando as energias do jogo. E seremos nós os responsáveis quando o maior jogador da terra perder um pênalti. A gente cuida para que vocês possam, nas festas de fim de ano, falar, hablar de mais um culpado pela derrota.

Isso tudo para admitir que, se o pé-frio carrega o azar, leva também uma vontade única de vencer. Ao dizer do meu azar, tenho vontade de afastá-lo, e ainda mais me blindar da ideia de que, de fato, o time que a gente torce, ou a causa que a gente acredita, pode sair vitoriosa.  A Argentina é boa, o Messi é o melhor. Hoje, podíamos ser campeões. Podíamos.


Foto de Luísa Machado.

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