Cigarras
lavadas em orvalho notas puras
levadas pelo vento folhas juntas
somam-se chilro mais chilro em uníssono
e cada qual a um galho está sozinha
Canção contemplando a primavera
(I)
As flores abrem, mesmo sem apreço;
as flores caem, com ou sem lamento.
Indagas quando, na saudade, faltas:
quando se abrem as flores, quando caem.
(II)
Colhi ervinhas, fiz um nó do amor,
para entergar a ele, o que me entende.
Da primavera enfim partia a dor,
cantaram os pássaros a primavera.
(III)
A flor ao vento e o dia que envelhece,
longe o momento, mais se alonga a espera.
Laço nenhum reúne amado e amante,
meu nó do amor no vazio se trança.
(IV)
Insuportáveis os galhos repletos,
são flores demais, saudades às pencas.
Na plena manhã, o espelho reflete
à primavera as lágrimas, o vento.
Xue Tao (768-832). Nativa de Chang’na (Xi’na), migrou da Capital quando criança para Chengdu, Província de Sichuan. Aos 16 anos, após a morte do pai, tornou-se cortesã. Talento precoce, há relatos de que escrevia poesia desde a infância. Participante ativa dos círculos literários de sua época, chegou a conquistar notoriedade como escritora, sobretudo em Chengdu. Contava, entre amigos e patronos, com alguns dos maiores poetas e escritores de seu tempo. Dentro eles, citam-se Bai Juyi, Du Mu, Liu Yuxi e Yuan Zhen – com este último, manteve um relacionamento, quando já tinha mais de 40 anos de idade. Em algum momento de sua vida (viveu até os 64 anos), teria se tornado também monja taoista. Dela permaneceram 89 poemas em antologias da Dinastia Tang, um número superior ao de qualquer outra poetisa de seu tempo.
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TRADUÇÃO, ORGANIZAÇÃO, NOTAS E INTRODUÇÃO DE RICARDO PRIMO PORTUGAL E TAN XIAO.