Camila Costa Silva nasceu em Lavras do Sul, no pampa gaúcho. É poeta, escritora e aluna do Clipe Poesia, no Museu Casa das Rosas. Mestre em Ciências Sociais pela PUCRS, trabalha com projetos literários na editora Coragem, em Porto Alegre.
aprendo a febre enquanto você
me volta à memória como foi
que nos encontramos quando
tudo era acúmulo máscaras
faciais sombra milhares de
mortes
medos bombas
nenhum contato não
sei à noite
quando me volta a dúvida e
eu leio que o mundo inteiro
deve assistir de suas janelas
a um eclipse solar
penso que é impossível
abrir um jornal sem chorar
nessa cidade
penso em você
me cobrindo
e de repente
você diante de mim
sentado em uma cadeira de escritório
medindo palavras o tom adequado
para dizer que todas aquelas coisas
que fizemos sem nenhum critério
a não ser o desejo o arroubo a vontade de chorar
gozando de sair para a rua
não olhar para direção alguma
que não fosse a das nossas bocas assim
você diante de mim
sentado em uma mesa de bar
esperando a hora em que irei ao banheiro outra pessoa
perguntará se a cadeira está disponível
e você dirá sim
pode levar
entre outras coisas, pai
talvez você não soubesse o nome
da flor que só apareceu
depois da sua morte
que ironia que aquela semente
de origem desconhecida
esperasse você morrer
para vingar na sua cor favorita
ou uma grande conversa do destino
ou nada mais do que o fato
de que certas coincidências acontecem
já outras são reivindicadas
talvez porque também sobrevivemos
senão, porque também nos decompomos
ainda que nos chamemos
perpétua
Arte: New York Daily News, de William Harnett.
