Laura Redfern Navarro (2000) é paulistana, poeta & jornalista. Toca a plataforma digital @matryoshkabooks, voltada à literatura brasileira contemporânea, realizando também serviços de comunicação para escritores independentes. Pesquisa a linguagem enquanto corpo, identidade e território nas vicissitudes feminino. Em 2021, foi aluna do Curso Livre de Preparação de Escritores da Casa das Rosas — o CLIPE-Poesia.
PRELÚDIO
Laura caminha pela /cidade/ deslumbrada
carrega:
o [nojo] ㅤㅤㅤe ㅤㅤㅤo [gozo]
entre as pernas
MANIFESTO
caminho o Coração desta Cidadeㅤㅤㅤㅤ [ainda que feda a mijo]ㅤㅤㅤnão O conheço
mas conheço a palma da minha mão quando O toca:ㅤㅤㅤsei que é caminho → ㅤㅤsei que éㅤ
caminho →
sei
exatamente onde se encontra essa Festa silenciosa & em tumulto,ㅤㅤㅤㅤveja só!, há:ㅤㅤㅤㅤ
[bugigangas]ㅤㅤㅤㅤ[frutas] ㅤㅤㅤㅤㅤ[sujeira] em toda parte!
& gente,ㅤㅤㅤㅤㅤ[gente],ㅤㅤㅤㅤㅤpois quanta Gente!
é aqui que me valho do velho direito de ser Anônimaㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤ
ㅤㅤㅤ ㅤneste meu Corpo-poeta;
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤtiram-me para dançar lembrando que preciso
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤensaiar
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤ/quase numa espécie de promessa/
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤ ㅤㅤpara um carnaval próximo
ㅤㅤㅤque começa
ㅤㅤㅤque começa
ㅤㅤㅤque começa
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤhoje mesmo
ㅤㅤㅤ/depois do expediente
LAURA VAI À 25 DE MARÇO
um diálogo com Stella do Patrocínio
I
me roubaram de mim
me roubaram o ㅤㅤㅤㅤcorpo
um manequim idêntico a mim:
ㅤㅤ ㅤ uma falsificação no lugar
do meu corpo
II
um [manequim] é um corpo
ㅤㅤㅤㅤum corpo autênticoㅤㅤ & com formas ㅤㅤㅤa ser manuseado ㅤㅤpelos corpos
quando ele é de verdade?
III
quem sou eu quando
estou de frente ㅤㅤ ㅤpara o espelho ㅤㅤ ㅤda loja?
afinal de contas →
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤ/eleㅤ~d i s t o r c e~ ㅤㅤa [imagem] ㅤdo corpo/
IV
a cidade ㅤㅤme perturba
ㅤㅤㅤa verdade é que ㅤㅤㅤㅤㅤㅤdesacostumei:
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤnão sei quando é o corpo ㅤㅤque ㅤe n g o l eㅤㅤㅤa cidade;
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤquando é a cidadeㅤㅤㅤ que bota o corpo ㅤㅤㅤ_(bueiro abaixo
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Mais sobre a obra
A plaquete O corpo de Laura propõe um deslocamento da personagem pelo meio urbano, unindo palavra, fotografia e a cidade de São Paulo a partir de lugares centrais da capital, como o Theatro Municipal de São Paulo, o Vale do Anhangabaú, a Rua 25 de Março e a Rua Sete de Abril. Iniciando-se com a personagem entrando em um transporte público e encerrando-se com a volta dela para a casa, é a partir do trajeto que insurgem temáticas como anonimato, corporeidade, erotismo e alteridade, reforçadas por fotografias de manequins, objetos descartados e vendinhas com edições colorizadas e hiper-saturadas. Desta maneira, o leitor vai reconhecendo o espaço a partir da construção da sensorialidade da personagem Laura.
Arte: Ennerdale Lake at Sunset, de A. Heaton Cooper (1905).