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Meu lugar

por Mayk Oliveira
Foto de Luísa Machado para o poema "meu lugar", de Mayk Oliveira.

Mayk Oliveira, sertanejo de Delmiro Gouveia nas Alagoas, é professor de História, Letras, músico e membro do movimento Arborosa. Já escreveu três livros de poemas: Livro dos Delírios (Parresia, 2020), Pétrino Astéri (Parresia, 2021) e Alcatrão Com Grilos (2022), um romance (a publicar) e um livro de contos Molhados Enxutos (2021).


meu lugar

faço do lugar, meu lugar
abro as cancelas do tempo na estrela de pedra
uma voz que sem respirar
emerge lancinante sob o abrigo do tempo
o nada perdura na afirmação da tesoura
na dureza do papel enquanto
deixamos a languidez da tarde
para estrada foi fiel e sustentou o feitio do sulco
aberto pelo passo da paisagem.
colho os frutos doces das sementes de glória.
o pão vindouro
brindado pelo suor.


areia

a rua, a penumbra, o virote da alma insone,
A cuia de umbu, o alto dos cânions,
a tela pintada no quintal,
a incerteza das onze horas,
as costas do pai, a castanha no doce,
o duplo seis de dados da fubica,
a música à tarde, o livro novo,
o sabre de sol pela fresta do telhado,
os insetos rocinantes,
o tempo suspenso tal o próprio.


pausa

fui o primeiro a levantar
e colocar no lugar o cheiros do jasmim,
durante o vento noturno das serras
cuja as várzeas fazem imenso rodopio
numa tela aquarelada de gotas de relva,
refestelava o magico vento destacando contra o sol
só um gemido da sentinela
no cair do chapéu do vilarejo


rezas mundana

eu sapo na boca da brasa
centésima asa na pena vadia
gemido cortante na noite atrasa
punhal do poeta em soneto ardia

púrpura fumaça do alto da serra
sinal encantado da nova nação
mergulho infinito no claro torrão
cantar colorido das raças da terra

separando a sorte em mitos e lendas
abrindo baralhos e mapas antigos
seguindo as rodas de sedas e sendas
no andeiro batuco o galope amigo

galo cantando rompendo o dia
tratando mania do grito eu calo
só falo com o padre vigário e vigia
melodia doendo para ele eu falo
pecado que trago na noite fria

bebum se rindo das lorotas que ouve
não tem quem se aguente com tanta heresia
cachorro rubi amigo me louve
nessa cidade pedra quem mata a folia


sapatilha de trava alta

na esquina do tempo em que me vou tenro,
limpando mão suja ferrão do lugar.
a linha que separa o aqui e o para sempre,
desde então a garatuja é sermão do cocar

despenca as chispas em beijos dos santos,
moeda bordão da vida mundana
sem ela o barqueiro não pode remar

mortais para o sopro um simples detalhe,
se não equilibra despenca da vida,
pulo medonho no seu infinito,
resta a reza no meu altar

gibão do sonho presente resgata o barqueiro,
cintilando a rudeza do ombro irmão,
raiz de beleza do fim derradeiro,
lançando ao poeta ouro em pá
na fé de augorão
o mote terroso
lustrando penacho
que é seu de rimar.


terra

sobe terra e cova
baila o triunfo da trova
e o brilho do aço
e a clareira nova

diante da medonha tralha
formigueiro humano mantém
num mundaréu de palha
além de nada um sonho vintém

o cavalo na folhagem escondida
a vida bandida que amanheceu
ou sua reza batida
beijada aos montes
encontrou o caronte
e a mão amiga carcomeu


Foto de Luísa Machado.

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