• 0

    Frete grátis a partir de R$ 110

[eu dançava tua dança]

por Morgana Mendes
Fotografia: Mercado – George Huebner (Acervo Instituto Moreira Salles).

Morgana Mendes é técnica em artes dramáticas e licenciada em teatro pelo IFFluminense. Atriz, poeta, produtora, iluminadora cênica e bonequeira. Pesquisa teatro de animação e tudo que der pra enfiar nele. Faz arte como o sonho febril de uma criança.


I.  

eu dançava tua dança  
você dançava olhos e ombros  
eu sempre fui um cavalo  
por onde andei  

você afiava sua faca  
eu prestava atenção nos seus dentes 
você era algo difícil de olhar nos olhos 
por entre  
o buraco da meia  

II.  

o ranger de dentes  
e o fechar das portas  
e janelas  
e outros métodos de correr o ar  
do miasma lá fora  
não importa mais a peste  

suas mãos podem jazer em corpo  
arrematado num leilão de outubro  
suas mãos podem jazer em corpo  
amarrado em memórias de corridas de cavalos    

onde não tinham pés  
apenas cascos  

suas mãos são livres  
pra correr o ar  
os cavalos tão livres  
suas mãos são livres para se deitar 
com mãos tão livres  
cemitério esse abraço  

III.  

me olha bem com olhos de lontra:  
seu coração é um cavalo.  

abraçar, com cuidado:  
dessa vez:  
usar luvas,  
conter o riso,  
mencionar a hora de ir embora,  
mencionar que esqueci meu suéter,  
respeitar o mistério como se respeitam os idosos, 
odiar o erro.  
historia da expansão americana:  

tanto a mercê  
me ouve bem com orelhas quentes  
seu coração é um cavalo.  

beijar, com cuidado:  
outra vez,  
sentir o sol,  
não torcer o piso,  
mencionar a hora de ir embora,  
mencionar o tanto que me perverte,  
insolência programada do respeito conquistado: 
odiar o fim.  
histórias hedonistas canela e limão  

tanto a verter  
me escuta  
entre s gemidos  
sério, presta atenção:  
seu coração é um cavalo.  

IV.  

doninha dona doninha;  
meu coração é um cavalo.  
a prova é a que se segue:  
pela décima vez esse mês  
estourei os dedos na quina da porta 
por cavalgar no peito  

aos mamíferos que possam ouvir chegar; 
meu coração é um cavalo.  
me ocupei das bulas de remédio 
e suas prescrições  
relinchava dosagens  
trotando uma posologia  
todo dia todo dia  
se eu pudesse era  
todo dia  

V.  

não sou um cavalo  
achei que era quando vi minhas patas 
os cascos ali embaixo  
o olho pra olhar no escuro  

mas eu não sou um cavalo  
por mais difícil que seja a palavra 
e relinchar pareça uma boa ideia 
meio ano versos três  

se um dia eu for um cavalo  
você de novo entre dois sóis  
faremos um piquenique  
senhor tempo virá  
ele treinará sussurros em nossos ouvidos 
faltando três minutos  
pra boa tarde  


Fotografia: Mercado – George Huebner (Acervo Instituto Moreira Salles).

Leave Your Comment

faz um PIX!

Caso dê erro na leitura do QRCode, nossa chave PIX é editora@aboio.com.br

DIAS :
HORAS :
MINUTOS :
SEGUNDOS

— pré-venda no ar! —

Literatura nórdica
10% Off