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evaporar

por Mariana Pasini
agnes martin the tree

por trás das costelas tem um corte
e também um vazio
feito de matéria não identificada
(a massa anterior ocupava tanto espaço
que foi um alívio 
– ainda que insosso –
livrar-me dela)
permaneço inteira enquanto evaporo
não faz falta o sal que me dissolvia


Agora

me toma e me relembra
nos braços de outra pessoa
só porque era bom e pronto
nos braços dele, ou dela, ou deles

me encontra em todos eles depois
esses, que continuam por aí
só porque é o justo a se fazer,
agora

me embala cantando baixinho
me sonha sorrisos novos
nos braços de todos eles,
agora

me descobre em toques novos:
aqueles que conheceu comigo
estão nos braços de todos eles,
agora


Ventre

me fazes gritar com a barriga
e conjugar verbos na segunda pessoa
fica bonito quando leio de volta pra mim
essas palavras incapazes de dizer 
o que só pelas entranhas 
se entende


Peito

Endurece o peito, moça
Que o mundo gosta de mulher 
Mas com o peito duro


Notas sobre uma queimadura

eu já sentia o calor
mesmo com a palma da mão longe
e me deixava puxar
(tanto quanto os insetinhos 
– ridículos –
se deixam puxar pela luz roxa da morte)

calor mexe com gente doida
(você já devia saber)
dá mais vontade de escaldar o couro
e quanto mais rápido melhor
– vai, vamo logo,
queima, filho da puta,
que daqui a pouco eu curo a ferida
ou algo assim
ou cuspo em cima e torço para fechar
ou faço coisa alguma 

tens tanto medo, querido
é tão lindo isso
só foi mais lindo o teu aceno lá de longe
o jeito como teu receio me quebrou
assim, sem nem pele
assim, sem nem corpo

eu, poema em linha reta,
as peles todas de fora mostrando o que estava dentro
puxava o fio das suturas 
e nada em mim cicatrizava

você, tabacaria,
teimava em achar uma ordem e uns termos e umas vírgulas
e se preparava para mostrar uma mão sem cartas
deixar a mesa
rejeitar uma aposta já ganha
e ir pra casa com a companhia que mais desejava:
tua mente vazia e sem peso


MINIBIO

Mariana Pasini é jornalista e autora do Pa, zine (Instagram & Medium), de publicação digital. Aos 31 anos, mora em São Paulo e ainda não sabe ao certo se o Pa, zine, é um pseudônimo seu.

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