Anna Carolina Rizzon nasceu no Rio de Janeiro, cresceu em Teresópolis e fugiu para São Paulo. Tem muitos diários.
I.
Percival –
diante de um rei impotente
carregado por corpos enlutados
pelas masmorras de uma fortaleza rendida
em um reino infértil
– senta à mesa posta –
sim, posta
de carnes e frutas e grãos
pútridos –
nada questiona
silencia e vê chorar
e nada resolve
e nada restaura
– porque não sabe o que perguntar
II.
o que eu sei da paixão
me veio à força
não como epifania
– como assalto
– e não sei mais do que isso
porque fala
a paixão
em dez-mil línguas
mas escolhesse qualquer uma delas
tampouco discerniria
o que que quero saber
III.
dez-mil línguas
e no entanto
eu e você
só nos entendemos em silêncio
IV.
Percival –
à sorte dos segredos
internos
e exteriores –
caos a priori –
com ternura
mais do que com compaixão
torna ao rei
e vendo-o sangrar
indaga
– o que te feriu?
V.
caos
a priori
porque o que eu entendo por
quase nunca é
– e concluí que não há o que restaurar
– todos os impotentes
enlutados
famintos
e todos os reis
fui eu que inventei
– e quando Percival pode
enfim
beber do cálice sagrado
– quando resolve
e quando restaura –
descobre que era tudo fantasia
VI.
há
tão somente
uma única pergunta a se fazer
em dez-mil línguas:
– o que você quer [de mim]?
VII.
não há
tão somente
uma única pergunta a se fazer
Foto de Leopoldo Cavalcante.