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da janela para dentro

por Jadson Rocha
Foto de Maria Cecília Chaves Machado para ilustrar "Da janela para dentro" e outros poemas de Jadson Rocha.

Jadson Rocha, artista visual baiano-brasiliense, vive e trabalha em Brasília-DF. Produz objetos, instalações, poemas, intervenções e performances, que exploram questões como vazio, fragilidade, palavra, miudeza e cotidiano. Economista, pela UnB, sua formação inclui ainda disciplinas de arte na universidade e cursos livres em instituições como Parque Lage e Caixa Cultural Brasília. Participou do programa de residência “together, separately”, oferecido por Cel del Nord (Oristà, Espanha) e das exposições coletivas “acervo rotativo”, na Oficina Cultural Oswald de Andrade (SP), “A margem do sonho”, no ColetivoRJ (RJ), “Diálogos distantes” e “Segundo Plano”, ambas na Galeria Tato (SP). Em 2021, apresentou a exposição individual “poeiras”, na Casa da Cultura da América Latina (DF).


da janela para dentro

como quem cruza um caminho estreito
reconquistado pelo mato alto
na ausência de visitas
que lhe confirmem o traçado no chão
ensaio percorrer mentalmente um inventário
das coisas protegidas dos olhos

convite

entre duas janelas está sua cama
e não sei qual delas
se avizinhará de mim
quando se um dia
a casa o quarto
abrigar como hóspede
também meu corpo

amar, verbo intransitivo

não vai rolar
como diz a Maria Valéria Rezende
esse substituto universal para acontecer no português brasileiro
peço licença à autora ou ao autor desta entrada em um dicionário digital
nunca o tive em mãos e agora o convido parcialmente ao mundo das coisas
essas que de tão infimamente físicas atraem-se pela gravidade
verbo transitivo direto e intransitivo
ser ou tornar-se realidade no tempo e no espaço
seja por acaso
seja como resultado de uma ação
ou como desenvolvimento de um processo
ou a modificação de um estado de coisas
envolvendo ou afetando
abre parênteses
algo ou alguém
fecha
pode rolar quando ambos tencionam tornar-se
realidade no tempo e no espaço um do outro
dou um exemplo
vibra o telefone
anuncia-se sem cumprimento embora repleto de cordialidade
um convite: vamos gozar juntos de novo

uma semana

o aspirador tem reservatório com capacidade extra
não sei como colocar à prova essa verdade
mas cabe de uma só vez o que de minha própria pele
misturou-se à poeira do mundo
sobra muito espaço no reservatório
para uma semana de mim
a menos que chova as janelas estarão sempre abertas
hão de fazer da casa como o ar fresco do lado de fora
hão de trazer fragmentos de mundo que repousarão sobre móveis e piso
e debaixo dos móveis
e nas falhas do piso
e suspensos no ar
sabe-se lá
não pesquisei
quantas células antecipam a diário a certeza da morte
em cada ser vivo antepassado da poeira
quanto ainda haverá de minha pele
nesse vento seco


Foto de Maria Cecília Chaves Machado.

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