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kunst/cunt

por Jefferson Dias
Jefferson Dias

Jefferson Dias, autor dos livros de poemas Último festim (Multifoco, 2013), Silenciosa maneira (Medita, 2015, mediante ProAC) e Qualquer lugar (Editora Primata, 2020). Tem poemas, contos, traduções e resenhas publicados em periódicos e portais de literatura, como euOnça (editora Medita), Caliban, Literatura & Fechadura, Germina, Ruído Manifesto, Ponto Virgulina, TriploV, Gazeta de Poesia Inédita, Mallarmargens, Poesia Avulsa e Poesia Primata.


KUNST/CUNT 

Com sua boca de cera 
Eu saio com sua boca de breu 
Como o último sol eu saio – 
É uma cidade sob a cidade 
Que se abre ao meu medo é 
A axila do medo é o  
Churrasco o sebo que funda a tarde nos
Subúrbios o azedume o pavor 
O frango cozinhando na  
Panela de pressão do medo empestando
Lentamente como um fórceps 
A antessala o umbigo da agonia 
As paredes glutinosas os caroços 
A pintura descascada do medo 
As crianças a bola murcha a equimose
No joelho na canela da noite 
Os gatos enfartados nas janelas –

Com seus olhos sem lábios com 
O cimento da insônia eu saio 
Eu suo o azedume a carniça 
Eu explodo na esquina 
Financio o fracasso – 360 parcelas –

Eu corro escarro perfuro o tímpano 
Do medo 
E piso

Na bosta.

Com uma tonelada de borracha 
Uma tonelada de pregos uma 
Tonelada de papel – uma tonelada 
Assinada carimbada timbrada protocolada
Em duas vias de papel – 
Com uma tonelada de nada 
Eu saio

À rua

Eu grito 
Eu morro 
Eu sou o cão negro do medo 
Que devora 
A própria

Bosta.


O MELHOR FRUTO QUE DESTA TERRA SE PODE TIRAR

O MELHOR FRUTO QUE DESTA TERRA SE PODE TIRAR

Antes do colar de ouro mui grande
Antes do
Brasão de armas
Do conselho de segurança nacional
Da secretaria geral
Antes do ato institucional:
A mumificação dos mortos
A carcaça
Da sacerdotisa
Saturada de cocaína
E tabaco

Um deus
Com seus pés
De 3000 anos
Um em cada lado do Atlântico
Sua sombra
Pesava 666
Talentos de ouro
E ventava com as nuvens
E todo olho via
E toda venta vertebrava uma árvore
Entrementes

Os outros
Atracaram:
Os ancestrais pressagiaram:

Viriam de onde sai o sol

Contristemo-nos!

Pois chegaram –
O almirante avistara três sereias –
Pois vieram –
Como a peste como a luz que não clareia –
Pois apearam –
De trezentos côvados o comprimento de seu cavalo de cinquenta
Côvados a sua largura e de trinta côvados a sua altura –
Pois grassaram –
Eram arimaspos dotados de um só olho na testa
Ciápodes de uma única perna bifurcada em dois pés uns
Sem cabeça com olhos nas espáduas e outros cinocéfalos
Andróginos pigmeus grifos antropófagos –
Tropel farto
Fartum empestou a praia –

E nada enxergavam senão por intermédio
De uma máquina chamada espelho
Assim o arauto apregoou muito fagueiro:
O melhor fruto que desta terra se pode tirar parece
Que será

Salvar esta gente.
E procedeu a chusma fedegosa ao salvamento

Acenderam

O grande fogo sob
O céu uma ferida purulenta
A lua um caroço sangrento
A noite um zumbido de bicheira –

Outra palavra e outro ensinamento
Estava instaurado o churrasco
A mais egrégia instituição da nação –

E tristeza no coração da terra
E alvoroço nos braços da terra:
Contristemo-nos!

Pois chegaram
Vieram de onde sai o sol
Ouvimos bem vossa loquela vosso razoamento
Este será um país cristão e conservador
De gente que tenha deus no coração
Seremos logo cristãos e conservadores
Visto que não tenhamos nem
Entendamos crença alguma.
Não houve mais fala ou entendimento
A barbárie era tamanha
Que não se entendia nem se ouvia ninguém –

A noite zumbia uma bicheira sobre
Os túmulos infartados.
Contristemo-nos!

Pois vieram
A grande obra
Ouro deflorado
Útero saqueado
Um nó de sangue
Imenso pasto
Onde pascem apenas
Aqueles que têm na alma
O patriotismo e querem
A liberdade
E o bem do próximo.

MAINTENANT

Meto as mãos – 
Tudo quanto se pode abarcar – 
No forno: 

Agora – 

Se eu resistir, 
Perseverando, 
Ante a dor excruciante, 
Poderei observar extático – 
E não haverá nada mais belo –, 

A carne separar-se dos ossos, 
As unhas se liquefazerem –

O churrasco de mim. 
O mesmo cheiro 
De útero. 

Tudo quanto se pode abarcar. 
Agora –

O medo ou 
O amor 
Têm o mesmo cheiro  
De túmulo.

(Haverá sob a  
Campa 
Espelho mais terno? Mais terrível?)

No entanto contamos as moedas, 
Erigimos a torre, 
Semeamos o grito no

Descampado.


Foto de Luísa Machado.

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