Paulo Scott é autor de, entre outros, A timidez do monstro e Mesmo sem dinheiro comprei um esqueite novo. Seus textos estão publicados em Portugal, Inglaterra, China, Argentina, Alemanha, Croácia, México, França e Estados Unidos.
nas praças, outras lonas
muitos ingressos-brindes
coreografias de sacos plásticos
abanando seus punhos
ao redor das barracas
o barro de seus estômagos
aspirando ao que
só deveria pertencer
aos animais noturnos
que cerzem seu minério
filtram-se do mundo
e dançam sua própria luz
a língua te espera
te reitera no sonho e no sorriso
tudo que (do Osório matinal) não se habitua à prestação
decerto pelo chegar da tristeza
a tal luz do existir
(e do perceber)
desvelos entre o estrago
timbre das gerações
por Silviano Santiago
(que de novo canta seu canto sozinho)
incessante e caminho
de quem levanta
e do que tem florescer
é tarde, muito tarde
e os cosméticos aguardam
a reciclagem de maneiras e fórmulas
cada vez mais dispendiosas
de reencontrar o perdão
o hábito de fingir nada saber
sobre o faminto verme da beleza
sem resgate e sem jeito
sem a armadilha de haver casa e volta
para as luzes que em mim te flagram
porque passam acesas
(faróis em vermelho)
na exigência dos ladrilhos
a pressa dos marinheiros
e, no lacrimejar, esse mal redigir
a incalculável reserva dos banheiros
não é no jardim da ignorância
o corpo que não quer responder
contingência no possível do tempo
combinando-nos em olhos que esqueceram
nada é familiar nesse ouvir
o erro que não condiz
no que pusemos a limpo
porque no medo daria, juro, daria
se você não estivesse rindo
não ter tamanho para a arte
aguardar de meus pais
um sorriso que só acontecia
assistindo a filmes de violência
certeza de família
que se repetia
uma vez por semana –
show das estrelas
quando a morte encenada
acelerava a vida
enquanto eu procurava
o que seria do meu lutar
(tão cedo e atrás)
no que, desassistido
(não saldaria)
nunca mais iria embora
Foto de Luísa Machado.