Tem poema que eu leio, amo e esqueço. A Árvore em Fogo, de Bertolt Brecht, é um deles.
Felizmente, vira e mexe esses mesmos poemas tornam, revivem; aí sim, guardo-os e evito esquecê-los. Li este pela primeira vez pouco depois de Bolsonaro ser definitivamente eleito; agora, revisito-o sob uma pandemia.
É prolixo falar de Brecht. Tem fontes que podem descrevê-lo melhor que eu. Só quero falar do poema mesmo, então a isso me reservo, grata pela licença e pela compreensão. Mas leiam Brecht para além disso.
Anna Carolina Rizzon
A Árvore em Fogo – Bertolt Brecht
Na tênue névoa vermelha da noite
Víamos as chamas, rubras, oblíquas
Batendo em ondas contra o céu escuro.
No campo em morna quietude
Crepitando
Queimava uma árvore.
Para cima estendiam-se os ramos, de medo estarrecidos
Negros, rodeados de centelhas
De chuva vermelha.
Através da névoa rebentava o fogo.
Apavorantes dançavam as folhas secas
Selvagens, jubilantes, para cair como cinzas
Zombando, em volta do velho tronco.
Mas tranquila, iluminando forte a noite
Como um gigante cansado à beira da morte
Nobre, porém, em sua miséria
Erguia-se a árvore em fogo.
E subitamente estira os ramos negros, rijos
A chama púrpura a percorre inteira –
Por um instante fica erguida contra o céu escuro
E então, rodeada de centelhas
Desaba.
Bertolt Brecht, em “Poemas 1913-1956“; seleção e tradução de Paulo César de Souza; São Paulo: Editora 34, 2000
A Aboio não tem fins lucrativos. Todos os direitos reservados à Editora 34.