Ingrid Limaverde, 25 anos sendo criada no sol de Salvador-BA, poeta, pesquisadora dos caminhos e desvios da escrita literária, professora, finalizando uma graduação em Letras Vernáculas pela Universidade Federal da Bahia. Tem poemas publicados em revistas eletrônicas e nas antologias O amor nos tempos de lonjura (2020) e Antologia de novos poetas: No princípio era o verso (2020).
Sacos plásticos podem ser boas alegorias
Há três dias com a cabeça pendendo para um lado só
me perguntando quanto pesa uma memória
e sussurrando como seria bom esvaziar os sacos
relaxar os ombros
sem os riscos de tudo se romper e rolar
chão abaixo
Certamente eu não cataria nada, restariam lá
as coisas expostas, talvez quebradas
derramadas imagino
Tento acertar o corpo
temo não sustentar o que sobra
Pernas firmes, pés forçando o piso escorregadio
É preciso ter fé em alguma coisa, me dizem
nos móveis, nos espelhos, na força da gravidade
Há três dias minha fé dobrou de tamanho
Isso aqui é um segredo
Existe um fio de qualquercoisa que nos salva
Uma parte do corpo
que engancha na blusa do tempo
e fica
Uma ranhura nos óculos que nos faz
empenhar algum esforço pra enxergar melhor
pra entender que forma tem aquele rosto
ali em frente, cansado, doído de saudade
Sempre tem uma espécie de planta não catalogada
Invisível, intocada
Tem aquelas coisinhas que a gente perde
que minha vó quando eu era criança
chamava de miunsaia
“guarda essas miunsaia pra não perder”
e perdia
(que tristeza funda
e breve
porque tinha mais
miunsaia se multiplica)
Existe um espaço pra todos os sonhos
que a gente não lembra
de prédios perseguidores e paisagens impossíveis
Existe um lugar pro nosso corpo inteiro
no mundo
depois que a gente vai embora
Eu acredito nisso
Foto de Luísa Machado.