Inhame

Inhame

por Leilane Leta

24 de setembro de 2024

Inhame

Seguro nas mãos
o inhame cru e
áspero que, sem
grandes pretensões
levarei ao fogo
alto. Enquanto meu ventre
molhado empreende
investigações genealógicas
próprias daquelas que
cultivam o hábito
de mastigar raízes

Gineceu

Dos crisântemos
aos lírios brancos
fala-se do colorido
dos amores-perfeitos

Dizem não existir
entre orquídeas mescladas
azaleias laranjas, gérberas
vermelhas, amarílis, hortências
azuis

Somos dálias
Hidrófilas
Bebendo frésias
Mornas

Indignas
de peônias
Navegando
em vitórias-régias
a flor de lótus

Após o encontro
Mais sagrado
das águas

Dois receptáculos

Tempo de Caju

Quando eu era criança
tinha uma roupa própria
para chupar caju

“Caju deixa nódoas”, gritavam-me
Trocava então a roupa

Corria descalça, protegida
por um agasalho
de verão

Tinha também um cajueiro
com o meu nome
Mas não podia levá-lo
para dentro
de casa

Não me alertavam, porém, das nódoas na pele,
Nem daquelas, por dentro, no estômago,
no peito

Não tenho mais um cajueiro
Só o meu nome
Uma ausência de casa
E uma pele de chupar nódoas

Parede (anti)aderente de
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤmágoas
Após a mordida
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤno
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤCaju

Fotografia: Rio Tamanduateí, antes da retificação – Vincenzo Pastore (Acervo Instituto Moreira Salles (https://acervos.ims.com.br/)).

Leilane Leta nasceu em 1987, em Aracaju, Sergipe. É autora do livro de poemas Era pedra e se quebrou, recém-lançado pela editora Urutau. Escreve, como não poderia deixar de ser, por linhas extrapoladas. Acredita que antes de tudo, a mensagem.