não é uma festa infantil
na varanda da minha casa
a festa é santa teresa.
fernando veste uma camisa branca.
é uma ilusão entender a rotação ansiosa na cabeça sonhos traiçoeiros que acordam a ira da minha mãe. ela apenas abre a porta sem perguntar por que estou dormindo antes das árvores recolherem seus ninhos.
fernando não está mais
na varanda da minha casa.
eu sei porque ele fala em novembro e é março e o homem que conversa com ele é o marcos um pesquisador do decadentismo.
fernando diz que não que era um encontro mas jamais estaria com um rapaz que se veste de urso no youtube e faz um show
na varanda da minha casa.
o problema não é ele não estar ali.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀o problema: dissecar todas as coisas gestos
comemorações para vê-lo intacto sem poder sentar no sofá
da sala ser o filhinho choroso da minha mãe apontando pra
fora dizendo ele estava ali.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀o problema: ter de acordar das festas sem
tempo de me despedir trocar de cômodo rápido demais me ocupar
de convidados que não limpariam a casa comigo.
*
tobogã
em todos os parques aquáticos
escorrega um menino de dez anos
⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀um homem de quarenta e nove
⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀uma adolescente de dezesseis
por vinte
e nove
metros
os brinquedos são reabertos porque é recreativo
⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ é apenas diversão
e
mais um barulho
mais um embrulho funerário
mais um corpo enferrujado pelo escorregador
mais uma falha de projeto
mais uma frouxidão das travas de segurança
mais um problema operacional
*
gosto como
você deita em cima
de mim pra ouvir
apartamentos como
se eu fosse o muro
que subia quando criança
& era uma árvore sem frutos
do outro lado mas
você olhava
leonardo ramos vive no rio de janeiro, é formado em letras, pesquisa literatura e esteve em autoexílio desde a pandemia. foi publicado em algumas revistas, se autoeditou no instagram, no medium, então pausou isso e foi sentir a vida, amar e descobrir se realmente a queria, se há o que dizer.