Ilustrações

Ilustrações

por Natan Schäfer

24 de setembro de 2024

Jailton Marenco Moreira (https://pt.wikipedia.org/wiki/Jailton_Moreira) (São Leopoldo, Rio Grande do Sul, 1960). Curador e cenógrafo. Junto de Elida Tessler, foi fundador e administrador do Torreão, espaço de produção, debate e pesquisa em arte contemporânea, atuante em Porto Alegre de 1993 a 2009. Ilustrações (https://aboio.com.br/produto/ilustracoes-jailton-moreira/) (Editora Aboio, 2023) é seu primeiro livro de poemas.

A MONDRIAN

Amar a parede.
Pelo branco
ver a rede.
Melhor, a luz
da reta que parte
gera outra reta,
negra em cruz.

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VELÁZQUEZ

Cada pintura chega como um reencontro com um velho amigo. Pintar essa intimidade é pintar a oferta. Para tanto, confere ao outro ali representado a dignidade real emprestada dos cães, dos anões, do negro, do ferreiro. Uma corte de seres desatentamente envolvidos na única tarefa: ser. O pincel acaricia essas personagens, passa a mão nos seus ombros e confere – “Tudo bem? Como tem passado? Precisam de ajuda?” Toques rápidos tramam vestidos em buquê para as infantas. O monarca amigo baixa a guarda, se deixa invadir e, derrotado, lamenta. O Papa vaidoso exibe mãos de rapina e atesta sua flama. Breda se rende e o vitorioso não espezinha. Os mitos encarnados ficam constrangidos ou logo se enturmam. Outros camaradas, outras charlas. Por trás do quadro, compareço. Que mistério é esse que dispensa enigmas e me adivinha? Está na cifra dos gestos, na atmosfera rarefeita, no quebra-cabeças de uma Aracne brincalhona, na camuflagem da armadilha, ou na familiaridade comentada? Um mistério que recusa o mistério. O que pode ser poesia é negociado por qualquer tantinho de prosa. A grande arte é fazer a arte desaparecer.

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SERRA

CANTO I
Chumbo que se derrama em gretas.
Do ângulo fundido, seiva metálica,
uma floresta medra.

Jornada escrita.
Um diário de vagas,
arrebentações e praias.

CANTO II
Aço ou osso
que, ao cortar, berra.
É a pedra do ferro que fica, ou óxido que libera?
Grito que assoma
canto, peso, quinas.
Aboia e tange um esqueleto que se arquiteta.
Sinuca de bico que o drible
avessa.

CANTO SEM CANTO
Jiboia e naja.
Uma serpenteia a sala,
outra apoia a cauda enrijecida e se entesa.
Duas víboras (ou uma)
ameaçam com suas táticas.

CANTAR
Serão infinitivos para tantos sem fins.
Logos, jogos e lugar.
Conjugar.

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Você acabou de ler três poemas de Ilustrações (https://aboio.com.br/produto/ilustracoes-jailton-moreira/) (Editora Aboio, 2023), primeiro livro de poemas de Jailton Moreira (https://pt.wikipedia.org/wiki/Jailton_Moreira), em pré-venda até domingo! Garanta já o livro com 10% desconto, frete fixo para todo o Brasil e nome nos agradecimentos.

Ilustrações (https://aboio.com.br/produto/ilustracoes-jailton-moreira/) é a tentativa de ordenar as experiências vividas por Jailton Moreira (https://aboio.com.br/tag/jailton-moreira) frente a determinados artistas e suas obras. São 29 poemas produzidos ao longo das três décadas em que o autor dizia ter abandonado a poesia. Agora, ele assume essa relação, mas coloca um quê a mais: se a imagem costuma ser um complemento ao texto, aqui o processo se inverte e o escrito é que se submete ao visual.

  • Ilustrações – Jailton Moreira (https://aboio.com.br/loja/produto/ilustracoes-jailton-moreira/) R$ 64,90 Comprar (?add-to-cart=6410)

Arte: Composição com Vermelho, Azul e Amarelo (https://en.wikipedia.org/wiki/Composition_with_Red_Blue_and_Yellow#) Piet Mondrian.

Natan Schäfer (Ibirama, 1991) é mestre em estudos literários pela Universidade Federal do Paraná e pela Université Lumière Lyon 2. Foi professor do curso de Bacharelado em Artes Visuais da UNESPAR, membro da Psychoanalytische Bibliothek Berlin e tradutor convidado nas residências Looren América Latina (Suíça) e Résidence Passa Porta (Bélgica). É autor de Taquaras (Contravento Editorial, 2022) e tradutor de, dentre outros, Por uma insubmissão poética (Sobinfluência, 2022) e La promenade de Vénus (Venus D’Ailleurs, 2022). Atualmente é responsável pela Contravento Editorial, também assinando a coluna "A Fresta" na página da editora Aboio. Além disso, dá a ver em desenhos, pinturas, escritos e fotografias algo da poesia que lhe atravessa.