Eduardo Rosal (Rio de Janeiro, 1986) é escritor, professor e antifascista. Autor de O sol vinha descalço (vencedor do Prêmio Maraã de Poesia 2015 e publicado pela Editora Reformatório). Doutor em Teoria Literária pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e pela Université Nice Sophia-Antipolis (França).
VIDA-FERIDA
Há quem prefira e busque
uma vida fechada,
cumprida antes do fim.
A cadeira de balanço da vitória
velando a última certeza.
Todas as respostas
postas à prova
entre comodismos, lucros
e outros apagamentos.
Eu, não.
Eu quero a vida em aberto,
a dúvida, a dor, o ódio,
o sal de frutas
depois das eleições
e sempre a esperança
no humano renovada,
apesar dos muros,
do gosto do fracasso
nas mãos.
A vida-ferida-aberta
sobre outras cicatrizes
e a aventura infinita,
dentro,
maior que todas as linhas
de chegada.
Uma vida em aberto,
de partanças e curvas
no escuro,
mas o abraço,
o café,
o bolo de fubá
e a coragem de não ser
um anônimo catalogável.
GRITO
Contra fascismos e neofascismos,
meu nome se escreve
com um rosal
empunhado nos olhos.
Já minaram as vidas,
os vocativos, a natureza
as calçadas e outros laços.
Já desgastaram as palavras,
os encontros e a esperança.
Só no Brasil há mais
de 530 células neonazistas
e sua engrenagem
que manda e mata
com autômatos tentáculos.
Contra fascismos e neofascismos,
Rosal se escreve com rosa
e uma lâmina transparente.
A rosa afia o que vejo;
a lâmina, o que escrevo.
A palavra fascista
é sempre a mesma,
unifônica, repetição
do apagamento alheio,
matéria de manuseio
a serviço de quem cala
o grito de quem morre
por não poder
expressar com liberdade
seu direito a ser quem é.
A palavra-resistência,
seja de lira ou antilira,
se afina e reafirma, sutil
e humanamente multiforme,
inaugurando outra forma de,
com a lâmina-poema, rasgar
a capa de ódio das palavras
para expressar com liberdade
o direito às diferenças.
VENENO DA BONDADE
Maior coragem é a dor,
a nódoa do outro.
Um desenho de ponte,
fisgado numa âncora.
Troco cartas com o soco.
Por trás da luz que dou a ver
guardo estas sombras.
Nelas produzo
o veneno da bondade.
Enquanto morro sempre
impulsiono nascimentos
― faíscas para novos gestos.
MARGENS I
Amar a água,
não pela sede.
Intuir sempre
o pé da fonte
e odiar o riso
que é só alegre.
Cumprir o tudo
desmontando
o nada.
Refazer futuros
sem a luva
do medo.
Nas margens do sonho
moldar, não a realidade
― essa matéria
sem fluxo ―,
mas o curso
de outra nascente.
TODOS/NINGUÉM
Onde não há desejo e rede,
resta o sol sombrio da fome.
Onde todos comem,
ninguém se veste de deus.
Você acabou de ler alguns poemas de O Sorriso do Erro, de Eduardo Rosal.
O Sorriso do Erro é a defesa do erro pelo erro em 42 poemas de Eduardo Rosal.
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O Sorriso do Erro – Eduardo RosalR$ 49,90
Capa de O Sorriso do Erro por Leopoldo Cavalcante.